A inviolabilidade do advogado como prerrogativa da defesa
- Lucas Marçal Ternus
- 23 de mai. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 26 de jul. de 2023
O presente trabalho busca analisar de forma breve a relação entre a inviolabilidade do advogado (art. 7.º, II, da Lei 8.906/94) e a ampla defesa (art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal), a fim de demonstrar que além de uma prerrogativa do procurador, trata-se de uma prerrogativa do investigado.
Inicialmente, cabe sinalar que o advogado exerce função essencial a administração da justiça (art. 133 da CF/88), em verdadeiro múnus público, sendo este inviolável nos limites da lei (art. 133 da CF/88 e art. 2º, §3, do EAOAB). Tal inviolabilidade deriva de diversos dispositivos, tantos constitucionais, quanto infraconstitucionais.
Posto isso, analisaremos apenas a inviolabilidade prescrita no art. 7.º, II, do EAOAB, em relação ao princípio fundamental a ampla defesa, previsto no art. 5.º, LV, da CF/88.
Feita esta breve introdução, passemos a análise da relação entre Advogado e cliente. A mesma se baseia na confiança, eis que investigado deposita no procurador todo o material probatório disponível, bem como a sua verdade e seus anseios. Em razão dessa relação de confidência o advogado possui como um de seus deveres o de sigilo (art. 25, caput, do código de ética e disciplina da OAB).
Por intermédio dessa relação de confiança o procurador extrair informações relevantes para o caso, que serão posteriormente utilizadas em favor de seu cliente, para assim o defender de forma digna. Tornando-se o defensor braço direito do acusado e seu único protetor.
Tais informações são essenciais para realização do seu mister e devem ser guardadas em sigilo. Não fazendo o procurador qualquer juízo de valor, eis que o dever do Advogado é o de defender o acusado. Neste ponto está a nobreza da advocacia, “[...] sentar-se sobre o último degrau da escada ao lado do acusado.[...]”[1].
Posto isso, passamos a análise da ampla defesa. Esta atua em – ao menos- dois espectros, a autodefesa exercida pelo investigado, enquanto se defende das ingerências do Estado (v.g, o interrogatório, que consiste em um exercício de autodefesa); e por meio da defesa técnica, realizada pelo advogado, que possui como dever defender o sujeito de forma especializada, a fim de garantir a efetiva proteção do indivíduo frente ao acusador. Sendo, este último, um “mecanismo de autoproteção do sistema processual penal”[2], responsável por perfectibilizar a defesa do sujeito de forma técnica.
Além disso, a ampla defesa garante a “paridade de armas no processo”[3]. Nota-se que caso a acusação tenha acesso as estratégias da defesa, acabar-se-ia com a paridade de armas, haja vista que na perspectiva processual o Ministério Público iria se prevenir em relação as investidas da defesa, bem como saberia quais pontos são mais frágeis na estratégia defensiva. Ocorrendo apenas a defesa formal do acusado, afastando a sua “[...] participação efetiva no processo penal, [...]”[4].
Sendo assim, objetivo do sigilo e das inviolabilidades do advogado é “garantir a plenitude do direito de defesa cristalizado no art. 5.º, LV, da CF/1988.”[5] Portanto, não é um privilégio do advogado, mas sim uma proteção ao cidadão,[6] que traz segurança ao investigado, em face de possíveis arbítrios Estatais, durante a persecução penal.
Por conseguinte, o advogado “goza do direito da inviolabilidade em razão da natureza especialíssima da sua missão profissional.”[7]
Nesse sentido, decidiu a Suprema Corte, quando julgou a ADI 1127, frisando que “[...] A imunidade profissional é indispensável para que o advogado possa exercer condigna e amplamente seu múnus público.[...]”, bem como “[...] A inviolabilidade do escritório ou do local de trabalho é consectário da inviolabilidade assegurada ao advogado no exercício profissional.[...]”.[8]
Ademais, salienta Renato Brasileiro:
[...] seria de todo contraditório que o Estado obrigasse o Advogado a guardar segredo profissional, enquanto toma conhecimento da conversa entre o defensor e seu cliente, dela se valendo para fins de persecução penal.[9]
Portanto, não cabe ao judiciário extrair essas informações para utilizar em desfavor do acusado. A utilização destas informações seriam dignas de governos totalitários, onde vigora a busca por uma verdade real, acima de qualquer garantia do imputado e de seu defensor.
Por fim cabe sinalizar que a inviolabilidade não é absoluta, podendo ser quebrada nos casos em que o casuístico seja o objeto da investigação, na forma do art. 7°, § 6º, do EAOAB. Apesar disso, não se pode utilizar esse material probatório em desfavor dos clientes, apenas em desfavor do procurador.
Posto isso, concluímos que a inviolabilidade, prevista no art. 7.º, II, do EAOAB, trata-se de uma prerrogativa do advogado e de seu cliente, eis que possibilita o exercício do mister do primeiro e o direito há uma defesa efetiva do segundo.
Referências:
[1] CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal. Tradução: Antônio Roberto Hildebrandi. 3 ed. Leme: Edijur, 2020. p.27. [2] LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 20 ed. São Paulo: SaraivaJur, 2023. p.85. [3] SARLET, Ingo Wolfgang; Marinoni, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 11 ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022. p. 900-901 [4] Silva, Igor Luis Pereira e. Princípios penais. 2. ed. rev., ampl., atual. Belo Horizonte: Fórum, 2020. p.317. [5] MESQUITA, Rodrigo Octávio de Godoy Bueno Caldas. Do sigilo profissional do advogado: natureza jurídica, extensão, limites e restrições. Revista dos Tribunais, [s.l.], vol. 869/2008, p. 66 – 98, mar. Revista dos Tribunais. [6] FARAH, Elias. Inviolabilidade do escritório do advogado. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, [s.l.], vol. 5/2000, p. 254 - 263, Jan - Jun / 2000. Revista dos Tribunais. [7] FARAH, Elias. Inviolabilidade do escritório do advogado. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, [s.l.], vol. 5/2000, p. 254 - 263, Jan - Jun / 2000. Revista dos Tribunais. [8] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação direta de inconstitucionalidade 1127. Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS - AMB. Relator: Min. Marco Aurélio, 17/ de maio de 2006. Disponível em: <https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=612210>. Acesso em: 24 abr. 2023. [9] LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 11 ed. São Paulo: JusPodivm, 2022. p.726.

Interessante.